sábado, 19 de junho de 2010

Os missionários, ou Providência Divina, ou Em nome de Deus

 Decidi-me por beber um martelinho de cachaça mineira e publicar este conto, mas não sem antes escrever esta nota. Esta é uma história de ficção. Que tirem suas conclusões e ofenda-se quem ofendido se sentir.

 A campainha tocou. Estranhou. Nunca recebia visitas tão cedo na tarde. Olhou pela janela e viu dois jovens parados ao portão. Usavam roupas sociais. Seriam vendedores? Abriu a porta.
- Sim? - falou alto.
- Senhora, boa tarde. - disse o mais baixo, de cabelos pretos e pele branca, um rosto fino. Tinha por volta dos dezoito anos. - Podemos falar?
Ela estranhou, mas se aproximou do portão.
- Pois não... - disse ela, ainda desconfiada.
- Nós somos missionários. Levamos a palavra de Deus em nome de nossa Igreja aos cidadãos. - disse o outro, mais alto, loiro e com o rosto coberto por algumas espinhas. - Poderiamos tomar alguns minutos do seu tempo?
Ela esboçou um meio-sorriso. Jovens missionários. Havia tempos que não ia à Igreja, passava a maior parte do tempo em casa. Era viúva antes dos quarenta anos. Religiosa. Assim como seu falecido marido. Aqueles jovens, tão bem-educados e simpáticos surgiam para ela como um alento para sua dor, vinda de uma ferida ainda não cicatrizada.
- Não estarão tomando meu tempo, queridos. - disse ela, finalmente sorrindo. - Querem entrar?
- Não senhora, por ora estamos de passagem. Mas leremos um trecho da Bíblia aqui mesmo.
Ela assentiu. O missionário mais baixo leu um dos Salmos. Ao fim, disseram:
- Que Deus esteja em vossa casa e que a Benção Divina paire sobre a senhora aonde for.
- Obrigado pela atenção e muito boa tarde.
Se despediram. Foram seguindo a rua em direção à proxima casa.
Passara-se uma semana. A capainha voltou a tocar, no mesmo horário, e lá estavam eles. Os mesmo jovens, com as mesmas roupas sociais. Ela os atendeu no portão.
- Que bom ver vocês de novo. - disse a viúva. - Na semana passada, vocês aqueceram meu coração com a leitura.
- São as palavras de Deus, senhora - disse o loiro. - Elas confortam quem tem ouvidos para o Senhor.
- E hoje, vocês não querem entrar? - disse ela, cordial.
- Não, senhora, não queremos incomodar... - disse o mais baixo.
- Insisto! Tomem um suco, ao menos.
Assentiram. A viúva abriu-lhes o portão da casa. Eles entraram, beberam, comeram e leram a Bíblia. Ficaram lá por meia hora, depois, educamente, agradeceram e se retiraram.
Foi assim por semanas. Com o tempo, não só paravam para fazer um lanche, mas já estavam jantando na casa da viúva depois dos cultos no templo, mais tarde pernoitando e tomando banho em sua casa. Ela os via como dois filhos que nunca tivera com seu falecido marido. Ela era estéril. Por isso, ter aqueles dois rapazes educados e respeitosos em sua casa era um presente de Deus.
Uma noite, quando os dois haviam terminado o jantar e se preparavam para partir, ela os deteve.
- Meninos, não tenham pressa! Fiquem mais um pouco!
- Mas já incomodamos o suficiente, senhora. Não seria delicado de nossa parte...
- Por favor, meninos. Eu insisto.
Assentiram, como sempre.
Sentaram nos sofás da sala. Ela foi ao bar e pegou uma garrafa do melhor vinho que tinha.
- Aceitem. É uma excelente safra.
- Senhora, - disse o rapaz de cabelos pretos - não nos é permitido ingerir álcool. É contra a os princípios da religião.
- Ora, por favor, uma taça não vai fazer de vocês hereges. Aliás, o próprio Jesus Cristo bebeu do vinho do seu povo.
Com este argumento, os rapazes pegaram as taças oferecidas e foram servidos do vinho rubro. Bebericavam comedidamente. A viúva bebeu um longo e gostoso gole. Respirou profunda e sonoramente com a sensação do álcool circulando em suas veias.
- Sabe, eu costumava beber muito com meu marido. - disse ela, o olhar distante e fixo. - Muito, digo eu, uma taça por dia, um costume nosso. Compravamos sempre do melhor. Agora, o que restou está aí, juntando pó. Nunca mais tive vontade de beber deste sangue de Cristo. Mas vocês são tão amáveis que me fizeram abrir uma garrafa! Isso é muito bom.
Tomou outro gole, esvaziando a taça. Em seguida, tornou a enchê-la, até a borda.
Os dois rapazes continuavam com as taças cheias, enquanto a viúva entornava uma após a outra. Ela ria alto, enrolava a língua, tropeçando nas palavras e nos móveis. Num dado momento, caiu no tapete da sala. Rindo ela pediu que os rapazes a ajudassem a levantar.
Ao invés disto, estavam soltando os cintos.
Parou de rir. Abriam as calças. De repente, estavam em cima dela, segurando-a com força, com violência. Ela nem ao menos conseguia reagir, não sabia se por causa do álcool ou do medo. Rasgavam-lhe as roupas, chupavam-lhe os seios fartos com gula repulsiva, tocavam-a estupidamente. Batiam-lhe nas faces com seus membros rijos. Pentravam-a, violavam-lhe o ânus, maculavam-lhe a boca, e não paravam, por Deus, não paravam. Emitiam sons grotescos, salivavam por sobre seu corpo tal animais selvagens, animais humanos. Ela gritava, gemia de desespero. Não paravam... Por Deus, não paravam.
Repentinamente, com um grunhido, cada um deles anúnciou o derradeiro momento. O rapaz mais baixo, de cabelos negros, ejaculou dentro de seu ânus, enquanto o outro sujou-lhe o rosto. O líquido viscoso e quente lhe corria nas faces e para fora de seu orifício. Os dois violentadores, recompondo-se, vestiram as roupas e saíram pela porta, abandonando a vítima. O vinho das taças jazia no chão, como ela própria. Lágrimas e esperma vil machavam-lhe as faces. Não sabia o que sentia. De repente, Deus a abandonara.  Não tinha marido, não tinha filhos, não tinha nada... Estava tão inerte por dentro quanto por fora. Apenas conseguia mover os olhos. Estes encontraram a foto de seu falecido marido. Ele parecia olhar para ela, como que querendo confortá-la, como se a chamasse...
Num impulso, ela pegou a garrafa de vinho, quebrou-a fazendo cacos voarem por toda a sala, e, com esta ainda na mão, cravou-lhe a extremidade pontiguada e fatal na garganta, exatamente como fizera seu marido, com quem se juntava neste momento. O tinto do sangue mesclava-se ao tinto do sangue de Cristo, enquanto ela jazia eternamente inerte.
 

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